Aqui no fórum gostamos muito de válvulas eletrônicas e essa tecnologia do século passado em boa parte foi toda projetada sem o auxílio de computadores ou calculadoras eletrônicas. Os engenheiros do passado não tinham calculadoras de bolso, precisas e rápidas, para ajudar nos cálculos dos circuitos (e todas as demais obras de engenharia) até o início dos anos 1970.
Quem assistiu o filme Apollo 13, deve ter observado que os engenheiros na sala de controle da NASA, usavam um objeto para fazer alguns cálculos na trajetória da nave espacial.
Esse objeto era a régua de cálculo (Slide Rule em inglês). Mesmo os astronautas levavam réguas de cálculo junto com eles nas naves Apollo.
Eu achei alguns sites que simulam o uso da régua de cálculo no computador, permitindo que a gente possa aprender a usar uma, sem ter uma de verdade.
Um deles é este:
http://www.bikerman.co.uk/images/sliderule/Aristo_970_Simulator/index.htmlPra ter uma ideia do nível de acurácia e precisão dos cálculos, vejamos como um engenheiro de 1950 faria pra descobrir a frequência de corte de um simples filtro RC muito usado entre os estágios de amplificadores a válvula.
A fórmula de frequência de corte é:
Fc = 1 / ( 2 x pi x R x C)
Qual seria a frequência de corte se o filtro usar um capacitor de 22 nF e um resistor de 470 kohms ?
A conta seria: 1 / ( 2 x 3.14159265 x 470000 x 0.000000022)
Essa conta é possível de ser feita com lápis e papel, mas é bem trabalhosa.
Com a régua de cálculo ficaria assim:
Primeiro vamos multiplicar os 4 fatores do denominador, pode ser em qualquer ordem já que a ordem dos fatores não altera o produto. Inicio com 22 nF x 470000 ohms.
A régua de cálculo usa duas escalas para fazer multiplicação, a escala C e a escala D. Ambas são iguais e representam números x de 1 a 10. Uma escala está na parte fixa (estator) e outra está na parte móvel que desliza. Como 22 e 470000 estão fora da faixa de 1 a 10, vamos pegar apenas os dígitos e guardar as potências de 10 a parte. Assim 22 nF = 22 x 10^-9 ou 2.2 x 10^-8 (guarde esta potência -8) e 470000 = 4.7 x 10^5 (guarde esta potência 5). Assim vamos multiplicar 4.7 por 2.2:
Pra achar o valor, a gente alinha o 10 (do lado esquerdo da escala C, com o valor 4.7 da escala D). Poderia ser o valor 1 na esquerda da escala C com o 4.7 da escala D, dá na mesma, mas precisa ver ser o valor a ser calculado não sai da escala D, aí usamos o extremo esquerdo ou o direito, o que funcionar.
Existe um cursor transparente com um traço vertical bem fino (hairline) que usamos para ajudar a encontrar o valor e marcar temporariamente). Movemos o cursor para o valor 2.2 da escala C e logo abaixo na escala D vamos ter o valor 1.03. O valor real é perto de 10.3, mas a régua não tem o valor 10.3 (D vai de 1 a 10), então encontramos um valor 10 vezes menor o que significa que temos que guardar uma potência de 1 (para somar com o -8 e o 5 anteriores, até aqui: -8 + 5 + 1 = -2).
O passo seguinte é multiplicar 1.03 por 2:
Usando o mesmo procedimento, chegamos ao valor aproximado de 2.06.
A seguir multiplicamos 2.06 por pi:
Chegamos a um valor de 6.5. Se lembrarmos das potências de 10, o denominador da fórmula é 6.5 x 10^-2. Precisamos calcular o inverso deste valor. Ao alinhar o cursor com o valor 6.5 da escala D, há a escala DI (D inversa, ou 1/x), que indica o valor de 0.154.
Então o valor final é 0.154 multiplicado por 1/(10^-2) que é 10^2 ou seja 0.154 x 100 = 15.4 Hz. Essa é a frequência de corte do filtro.
Se fizermos na calculadora com todos os dígitos, vai dar:
Ou seja, chegamos a um valor praticamente igual e válido para o circuito, considerando as tolerâncias dos componentes. É importante ter em mente a importância de se ter registrado a ordem de grandeza e magnitude dos números (as potências) para se chegar ao resultado correto. Hoje em dia, não se dá importância a isso e as pessoas perdem a noção da magnitude das unidades. No cotidiano tratamos de nomes como Giga, Tera, nano, micro, que são múltiplos muito grandes ou muito pequenos e perdemos a noção da magnitude deles nas nossas contas ao usar o computador ou a calculadora.
Quantas obras de engenharia foram realizadas no passado sem computadores ou calculadoras, apenas com o auxílio de uma régua de cálculo.
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